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Proposta de gasolina E35: riscos e impactos do aumento do etanol no Brasil

A discussão sobre o aumento do teor de etanol anidro na gasolina, atualmente fixado em 30% (conhecida como gasolina E30), reacendeu após o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), defender publicamente a elevação desse percentual para 35%. A declaração foi feita durante a 25ª Conferência Internacional da Datagro sobre Açúcar e Etanol, em São Paulo, e visa dar continuidade à política de fortalecimento da indústria nacional de biocombustíveis e alinhamento do país às metas de descarbonização, como as previstas no Programa Mover.

A pauta já havia ganhado força em agosto, quando o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou a transição da mistura de 27% para 30%, resultando na gasolina E30. Entretanto, a proposta de avançar para 35% traz consigo preocupações técnicas significativas, especialmente em relação à frota circulante de veículos.

Críticas e questionamentos sobre os testes da gasolina E30

Apesar da aprovação oficial, a transição para a gasolina E30 não foi isenta de críticas no meio técnico. O especialista mecânico e jornalista Gerson Borini, em participação no podcast Auto+ #104, questionou a responsabilidade e a metodologia dos testes conduzidos pelo Instituto Mauá.

Segundo Borini, houve uma falha crítica ao não realizar um teste comparativo (chamado de Base Line), avaliando primeiro a gasolina E27 para, em seguida, testar a E30. Os testes se concentraram apenas na E30, e os resultados negativos, como falhas na partida e na condução de veículos, foram descartados sob a justificativa de que os carros já estavam muito usados.

Outro ponto levantado foi a pressa no processo. Uma nova calibração para o lançamento de um carro, que idealmente requer 24 meses para cobrir os ciclos de verão e inverno, teve seus testes reduzidos a apenas três meses no caso da E30. Para o especialista, o mínimo aceitável, mesmo acelerando o processo, seria de 12 meses.

Mesmo o teste de partida a frio foi feito de maneira questionável, ocorrendo em um contêiner refrigerado na sede da Mauá, em São Bernardo do Campo. O padrão ideal seria simular condições reais de altitude e frio, como em Campos do Jordão, o que não foi feito.

Impactos do aumento do etanol em veículos

A maior preocupação com a elevação do teor de etanol na gasolina recai sobre os modelos mais antigos e, principalmente, os importados, que foram calibrados para lidar com misturas muito menores de etanol do que a utilizada no Brasil, que já tem a maior concentração de etanol anidro do mundo. Os veículos flex fuel são menos suscetíveis a problemas, pois foram projetados para funcionar com diferentes proporções de etanol.

O etanol possui características distintas da gasolina que podem afetar o motor:

  • Corrosão e umidade: O etanol é mais corrosivo e absorve mais umidade, o que pode acelerar a oxidação de componentes metálicos e danificar o sistema de injeção de carros não projetados para essa concentração.
  • Ponto de combustão: O ponto de combustão mais alto do etanol altera o funcionamento do motor, podendo causar sintomas como batida de pino (pré-ignição), falhas na marcha lenta e aumento do consumo.
  • Menor poder energético: O etanol queima mais rapidamente e exige um volume maior para gerar a mesma energia que a gasolina, o que resulta em um consumo de combustível por quilômetro rodado.

Promessa de economia e o cenário futuro

A mudança para a gasolina E30 foi anunciada com a expectativa de reduzir o preço final do combustível nas bombas em cerca de R$ 0,13 por litro. Contudo, na prática, essa economia não se concretizou de forma significativa para o consumidor, frustrando as expectativas.

O receio atual é que um novo aumento para E35 repita o cenário: ganhos políticos e ambientais para o governo e o setor sucroalcooleiro, mas sem o benefício econômico prometido ao motorista, e com um risco acrescido de problemas mecânicos, especialmente para proprietários de carros mais antigos ou importados.

É importante notar que a elevação do percentual de etanol até 35% está prevista na Lei do Combustível do Futuro, aprovada na Câmara em 2024, mas condicionada à análise técnica e à comprovação de segurança mecânica e viabilidade. Ou seja, o avanço para a gasolina E35 dependerá de avaliações que garantam a integridade da frota brasileira.

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