A transformação da Seat na Cupra, dentro do Grupo Volkswagen, é um enredo que lembra o filme “A Substância”, onde a protagonista Elisabeth Sparkle (Demi Moore) cria uma versão mais jovem e idealizada de si mesma, chamada Sue (Margaret Quiley). No mundo automotivo, a Seat, marca espanhola fundada em 1950 e parceira da Fiat antes de integrar o Grupo Volkswagen em 1982, parece estar dando lugar à sua versão mais recente e esportiva, a Cupra.
Com a entrada da Skoda no grupo em 1990, a Volkswagen se viu com três marcas de posicionamento similar em seu portfólio. A solução foi diferenciar: a Volkswagen ficaria levemente acima das marcas generalistas, a Skoda seria a opção de custo-benefício, e a Seat assumiria o papel da esportiva da família, focada em baixo custo, mas com um “tempero espanhol”.
De divisão esportiva à marca independente
O foco esportivo da Seat se concretizou com a criação da divisão Cupra em 1996. O nome, derivado de “Cup Racing”, marcava sua vocação para competições, substituindo a antiga Seat Sport. Ela seria o equivalente da Abarth para a Fiat ou da AMG para a Mercedes-Benz. O primeiro modelo a ostentar o emblema foi o Ibiza GTI Cupra Sport.
No entanto, a Seat enfrentava um cenário de vendas em queda e um lineup desatualizado. Em 2018, a Volkswagen tomou a decisão estratégica de transformar a divisão Cupra em uma marca independente.
A consolidação da Cupra
Inicialmente, a Cupra herdou modelos da Seat. O único Cupra vendido pela Seat, o Leon, foi rebatizado como Cupra Leon. O SUV médio Ateca, que teria uma versão esportiva, já nasceu sob a nova marca como Cupra Ateca. As versões civis desses modelos, no entanto, continuaram a ser vendidas pela Seat.
A verdadeira virada de chave aconteceu em 2020 com o lançamento do Cupra Formentor, o primeiro modelo totalmente original, sem um equivalente na Seat. Esteticamente, os Cupra se diferenciavam dos Seat por um visual mais esportivo e detalhes na cor cobre.
A consolidação da identidade da Cupra continuou com o lançamento do Born em 2021, um equivalente do Volkswagen ID.3, que originalmente seria lançado como Seat El Born. O modelo migrou para a marca esportiva devido ao sucesso crescente da Cupra, que tem sido informalmente comparada à “Porsche da classe média”.
A partir daí, a Cupra acelerou a introdução de modelos com design próprio, apresentando o Tavascan, totalmente elétrico, em 2023, e o Terramar, sucessor do Ateca, em 2024.
O abandono progressivo da Seat
Enquanto a Cupra prosperava e expandia seu lineup, a Seat não lançou nenhum carro novo nem reestilizou seus modelos existentes. A estratégia da Volkswagen sugere um “abandono progressivo” da Seat em favor da Cupra. A situação se assemelha ao drama do filme, onde a versão mais nova se torna a protagonista.
Apesar do impulso da Cupra, a Seat ainda registra um volume de vendas maior. Em 2024, a Seat vendeu 310 mil carros, sustentada por modelos mais antigos e acessíveis, como o Ibiza e o Arona (equivalentes ao Polo e T-Cross brasileiros). No mesmo período, a Cupra vendeu 248,1 mil carros.
Contudo, a Volkswagen enxerga a Cupra como um negócio mais promissor. O ticket médio da Cupra é significativamente mais alto, e a marca não possui equivalentes diretos em outras montadoras do grupo, como Volkswagen ou Skoda, o que lhe garante um posicionamento único. Diferentemente do desfecho dramático do filme “A Substância”, o Grupo Volkswagen parece estar orquestrando um final feliz de negócios para, pelo menos, uma de suas marcas.